NÃO, NÃO É UMA CENA DE ESTUPRO! SE VOCÊ ESTÁ PROCURANDO POR ISSO, SE FUDEU! PERVERTIDO. A PRÓXIMA ESTUPRADA PODE SER A TUA FILHA, TUA ESPOSA, TUA IRMÃ, TUA MÃE, TUA SOBRINHAZINHA, TUA AVÓ. VAI SE TRATAR, SEU BROXA!


Não há como negar que o filme é violento, ele usa a violência de forma extremada e foi muito criticado por isso. É engraçado um filme como esse ser criticado pelo uso de violência explícita (mas não barata) num mundo onde boa parte dos filmes comerciais usam de maneira vil e gratuita cenas de violência. Tudo bem. O chocante no filme não é a violência, estamos acostumados a vê-la nas telinhas e telonas todos os dias, mas, talvez, seja o fato de uma delas reproduzir um estupro em um lugar público (passarela ou estação de metrô), colocando um homem qualquer como estuprador (só depois é que se descobre que ele é um cafetão de travestis) e uma mulher comum como vítima (a mulher é uma mulher que tinha uma vida bem comunzona). A cena é tão real e tão terrível que impossibilita qualquer excitação (se você assistiu e ficou excitado, mate-se, você é um perigo para a sociedade e se você ficou excitada, procure um psiquiatra que te encaminhe a um manicômio, pois você é louca) e desconstrói os mitos muito repetidos de que ser estuprada é fantasia de toda a mulher e que é a vítima que provoca o vitimizador, no filme, a culpa pelo estupro não é da personagem estuprada, mas do personagem estuprador, ele decide violentar aquela mulher que passava por ali. Da mesma forma que Madame Bovary não chocou por falar de adultério, que era um tema muito recorrente na literatura da época, mas por usar o discurso direto para narrar a história da frígida mulher, Irreversível não choca por usar cenas de violência, mas por mostrar a violência de uma maneira que, geralmete, não é retratada: realmente real. A realidade das cenas chocam, o fato de mostrar uma mulher estuprada sem nenhum glamur ou romantismo causa mal-estar em quem assiste. Outros elementos do filme colaboram com o atordoamento que ele causa, como a história ser contada a partir do final, as cenas serem muito rápidas e movimentadas etc.
O estupro é, talvez, a maior expressão do machismo que nossa sociedade moderna mantém desde os tempos da caverna (se bem que, acho, não devia ser muito comum nos primórdios da humanidade). Machismo, para mim, que sou homem, é violência, qualquer forma dele, desde o não auxílio nas tarefas domésticas até o sexo não consentido (só para usar uma outra expressão, que nunca deveria acontecer, mudar o nome adoça o ato, mas isso fica para outro post).
Quando o filme foi lançado, em 2002, não entendi o porque do alvoroço com a tal cena já que a propaganda de moda da época só usava a violência, principalmente contra a mulher, como inspiração. A fotografia da época do tal heroin-chic colocava mulheres em situações de inferioridade, muitas prestes a serem violentadas ou depois de terem sido, sempre com roupas muito fashion, macérrimas, com aspecto de mortas ou maquiadas com a inteção de parecerem espancadas, tudo muito bonito, bem montado pelos fotógrafos, afinal, moda é arte. Poucas "feministas loucas" reclamavam desta forma de "expressão artística" da década de 90, mas a maioria das pessoas achava realmente muito chic tudo aquilo ou nem ligava para o que via. Talvez por só "insinuarem" a violência e erotizarem mulheres mortas, espancadas e estupradas, essa fase da propaganda de moda não causou muito o furor do público, ela deixava tudo no lugar comum, meio q
ue escondido, como é na realidade. Quando Irreversível chega, ele esfrega na cara de todos o que a propaganda só insinua, o filme rasga o véu que cobre a violência contra a mulher e faz com que todos que o assitem tenham que ver com os olhos bem abertos o que a propaganda de moda glamuriza, o lado feio, real da violência. A cena em sí não é o que causou os protestos da platéia e da crítica, mas o fato de um prato tão indigisto ter sido ofertado como principal e único no jantar sereno que é o mundo dos homens, o problema foi mostrar o que todos querem esconder.

Pela lei, o estupro fere a honra da mulher; pela tradição, a da família, mas em nenhuma esfera fere a mulher, seu corpo e sua alma, ou vocês já viram mulheres em tribunais de guerra testemunhando contra seus estupradores? Ele, o estúpro não é atrocidade de guerra, ele faz parte dela, como de todos os dias

3 comentários:
Oi, Canis. Eu detestei Irreversível, odiei aquela cena interminável que mostra um estupro em tempo real. E não acho que surtiu a intenção desejada. A intenção era chocar? Bom, pras mulheres ver uma cena horrorosa dessas quase equivale a um estupro. Está muito perto da nossa realidade. Não há necessidade de vermos uma cena assim - nós sabemos como é um estupro. Pros homens, a cena não choca, mas sim excita. Ao menos, se vc ler as reações, tanto dos críticos quanto do público masculino, o filme ficou famoso pela cena em que a gostosona da Monica Bellucci é estuprada. Nove minutos de sexo, uau, que maravilha! A sua própria descrição no primeiro parágrafo descreve a roupa dela e diz que ela está sensual e linda. Depois, vc glamuriza o estupro quase tanto quanto o heroin chic glamurizava o vício: o estuprador está louco de tesão, sentindo-se o máximo por estar transando com uma mulher tão linda?! Quando eu vi o filme - e eu só vi uma vez, já que não são masoquista -, não tive nada dessa impressão do cara "louco de tesão". O estuprador está totalmente consciente, frio até, e usa muita violência física para cometer sua violência sexual. Ele já estava batendo em outra mulher antes. Só muda de mulher. Se ela é a Monica Bellucci ou não não faz a menor diferença pra ele.
Mostrar nove minutos de um estupro me parece uma violência gratuita inexplicável. Vc sabe que uma cena dessas vai causar reações totalmente diferentes entre homens e mulheres.
Mas não se zangue comigo por eu discordar de vc. Estou esperando o seu guest post de como deixou de ser machista, ok?
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